PARANÁ

Ministério Público investiga fala de desembargador do Paraná por possível dano moral coletivo a mulheres

Luis Cesar de Paula Espíndola tirou licença remunerada após repercussão das declarações. Desembargador disse que se afastamento é para cuidar da saúde da mãe dele.
11 de julho de 2024
Compartilhe

O Ministério Público do Paraná (MP-PR) abriu um procedimento para investigar a fala do desembargador Luis Cesar de Paula Espíndola, do Tribunal de Justiça do Paraná (TJ-PR). Durante uma sessão, ele disse que “as mulheres estão loucas atrás de homens”.

A declaração foi dada no dia 4 de julho, enquanto a 12ª Câmara Cível, da qual Espíndola faz parte, julgava o pedido da defesa de um professor de uma escola pública para derrubar uma medida protetiva que proíbe ele de se aproximar de uma aluna de 12 anos.

No processo, a garota informou que se sentia assediada e que o professor dirigia olhares maliciosos a ela. Por quatro votos a um, o Tribunal decidiu manter a medida protetiva.

O procedimento, chamado pelo MP como “notícia de fato”, foi aberto pela Promotoria de Justiça de Proteção aos Direitos Humanos, que vai apurar possível prática de dano moral coletivo ao gênero feminino do desembargador.

A sessão onde Espíndola se manifestou sobre o caso da aluna foi transmitida por uma rede social oficial do Tribunal de Justiça. Após a repercussão, o vídeo foi retirado do ar pela Corte, que tomou a decisão para “preservar as partes” do processo que era julgado.

O desembargador tirou uma licença remunerada, que começou nesta quarta e vai até o dia 31 de julho. Este tipo de afastamento remunerado é um benefício previsto no estatuto dos funcionários da Corte ao funcionalismo público e que não exige a apresentação de um motivo para ser desfrutado.

Como a licença é remunerada, ele continua recebendo o salário normalmente.

De acordo com o Portal de Transparência do TJ-PR, no mês de maio de 2024 - o último disponibilizado no site - o total de rendimentos do desembargador foi superior a R$ 133,6 mil. Com os descontos, o rendimento líquido totalizou R$ 92.673,88.

Em nota, Espíndola disse que se afastou para cuidar da saúde da mãe dele, que “teve o quadro de saúde prejudicado por conta da repercussão do fato na mídia”.

Protestos

 

Nesta quarta, a 12ª Câmara Cível se reuniu pela primeira vez após as declarações do desembargador.

A sessão contou com a presença de procuradoras do Ministério Público, desembargadoras, juízas e representantes de entidades de defesa das mulheres, que se manifestaram contra a fala de Espíndola.

“Jamais um juiz pode esquecer o compromisso de cumprir a lei, e cumprir com integridade, efetividade e imparcialidade”, disse a desembargadora Joeci Camargo, que é vice-presidente do TJ.

Durante uma solenidade nesta quarta, o presidente do Tribunal, desembargador Luis Fernando Tomasi Keppen, evitou comentar da polêmica envolvendo o colega, mas garantiu que a Corte jamais daria aval a posturas e declarações como as que foram dadas por ele.

CNJ apura conduta

 

Na última sexta-feira (5), o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) abriu uma reclamação disciplinar contra o desembargador.

A reclamação foi aberta pelo corregedor nacional de Justiça, ministro Luis Felipe Salomão, em função de "discurso potencialmente preconceituoso e misógino em relação à vítima de assédio envolvendo menor de 12 anos".

Segundo o CNJ, Espíndola será intimado da decisão e terá 15 dias para prestar informações sobre os fatos. O processo tramitará em segredo de justiça.

Conforme Salomão, situações de violência institucional contra mulheres têm sido alvo de atenção da Corregedoria Nacional de Justiça.

 

O que o desembargador disse?

A 12ª Câmara Cível é a responsável no tribunal por julgar casos de Direito de Família, união estável e homoafetiva.

No caso analisado pelo colegiado na última quarta, a derrubada da medida protetiva em debate envolveu uma aluna de 12 anos que sentiu assediada por professor de uma escola pública do interior do estado.

O julgamento levou em conta mensagens com elogios enviadas no meio da aula para o celular da menina. Além disso, o professor foi investigado e absolvido na área criminal por suspeita de ter importunado a criança.

Por quatro votos a um, o tribunal decidiu manter a medida protetiva que proíbe o docente de se aproximar da vítima. O voto contrário foi do presidente. Ao justificar o voto, Espindola disse que não concorda com a atitude, mas que não há provas contra o professor.

"Muito embora essa conduta, né, para alguns não seja própria e eu até concordo que para mim não seria próprio, mas hoje em dia, a relação aluno e professor, sabe, a gente vê, não só... Lá é uma comarcazinha pequena, do interiorzão, todo mundo se conhece, sabe? É diferente de uma assim... de uma Curitiba da vida, sabe, ou de uma cidade maior", disse Espindola.

Logo após o desembargador proclamar o resultado, a desembargadora Ivanise Trates Martins, que não fazia parte do quórum, se manifestou:

"Nós, mulheres, sofremos muito assédio desde criança, na adolescência, na fase adulta, e há um comportamento masculino lamentavelmente na sociedade que reforça esse machismo estrutural, ou que hoje a gente chama de machismo estrutural, que é poder olhar, piscar, mexer, dizer que é bonitinha, 'uma sua roupa tá com você, tá?' Puxa esse jeitinho de fazer de conta que tá elogiando, mas que, nós mulheres, percebemos a lascívia quando os homens nos tratam dessa forma. E talvez os homens não saibam ou não tenham ideia do que uma mulher sente quando são tratadas com uma lascívia disfarçada. Nós sabemos, uma piscadinha, um olhar, quem sabe numa sala de aula, ou em qualquer outro lugar, extremamente constrangedor, extremamente constrangedor", disse Ivanise.Em seguida, o presidente da 12ª Câmara Cível voltou a se pronunciar:

Por G1 PR

Leia também